Mercado para Personagens de Quadrinhos Nacionais. Existe?

Quando soube da existência da internet, por volta de 93, 94, as pessoas estavam maravilhadas com a facilidade de fazer contato com qualquer lugar do mundo.

Pouco depois, criaram um browser que só tinha a opção cinza de background, para você criar um site.

Para um cartunista isso era extraordinário, maravilhoso! Poder publicar seus desenhos, personagens, para outras pessoas conhecerem. E foi aí que publiquei a tirinha do “Nérd e sua Turma”, em abril de 1995, aproveitando que a internet comercial no Brasil começava.

Meu namorado, na época, foi fazer uma consultoria no grupo Abril e mostrou o site do Nérd. Alguns ficaram assustados: “como assim, publicar quadrinhos sem ganhar nada com isso!?”

Mais tarde, na época dos cartões virtuais, publiquei o site do Gompy com mais personagens autorais. Fez sucesso e rendeu prêmio em um concurso de sites na época.

Mas o que quero dizer contando esta história? O seguinte: a internet trouxe uma grande esperança e oportunidade para os desenhistas e cartunistas. Eles publicam suas tiras e desenhos na internet, com o desejo de algum dia ter uma publicação em livro, revista, etc. Está é a grande oportunidade.

No entanto, o Brasil é conhecido por não dar valor ao seu produto nacional. Cadê o mercado pra quadrinhos brasileiros? Existe? Em se tratando de quadrinhos infanto-juvenis, praticamente só há a Turma da Mônica.

Tiras em quadrinhos então… é uma lástima, uma tristeza!

Por volta do ano 2000, com um prêmio na internet para o Gompy, eu corri atrás para conversar com pessoas entendidas do mercado brasileiro de quadrinhos. Falei com um senhor, que tinha grande conhecimento no mercado de personagens de quadrinhos e animação, e em  licenciamento.

Foi um grande balde de água fria. Algo que suspeitava, mas que ele confirmou: “Não há mercado para personagens nacionais!”

É muito mais fácil e barato publicar e apostar no que vem de fora, ou melhor, no que vem dos EUA.

A falta de perspectivas que se criou foi tal  que me paralisou. Fiquei deprimida mesmo. Parei com o Gompy, e depois de um tempo e do nascimento de duas filhas, comecei a me dedicar a um blog e podcast de entretenimento chamado “Monalisa de Pijamas”.

Surgiu então uma nova esperança para os cartunistas com o Blog Books. Não só para mim, mas para outros cartunistas também!

Há tempos queria retomar o Gompy e aproveitei a oportunidade.

E vejam só, o Blog Books deste ano confirmou aquilo que escutei em 2000: “é mais fácil apostar no que vem de fora”. É algo garantido!”  elegendo o vencedor não um blog que produz quadrinhos, mas um que fala de Quadrinhos de Editoras Americanas e filmes de heróis.

Não desmereço o ganhador na categoria Quadrinhos do Blog Books.  Eles estão de parabéns pelo trabalho que fazem.  Mas novamente eu (e tenho certeza que os outros cartunistas sentiram-se assim também) recebi mais um balde de água fria do mercado.
Parodiando as últimas tiras da Pluma: Cadê meu espaço? Será que  existe?

Raquel Gompy
PS:  este post é de 29/setembro/2010 . Mas mudei a posição dele no blog, para que os novos visitantes possam ver primeiro as tiras. Poderia apagar este desabafo, mas aí implicaria apagar os comentários recebidos. Não quis fazer isso.

11 Respostas to “Mercado para Personagens de Quadrinhos Nacionais. Existe?”

  1. Ruz Says:

    Eu também não acreditei. Esperava que o prêmio viesse pelo menos pra quem é cartunista. Só no Brasil mesmo tem mais valor um blog que apenas fala sobre quadrinhos norte-americanos do que o trabalho de ilustradores e cartunistas nacionais. É realmente uma lástima.

    Força, Raquel! Seu trabalho é muito bom e vai chamar a atenção da galera ainda.

  2. Israel Says:

    Oi Raquel (ou Mafalda), primeiramente quero lhe dar parabéns pelos 2 projetos, tanto o Gompy quanto o Monalisa de Pijamas.
    É realmente mto triste saber desse resultado, aliás, saber que a muito tempo a questão ainda é a mesma. Se existe mercado ou não.
    Eu tenho 22 anos e desde sempre desenhei. A 10 anos eu comecei a freqüentar eventos de cultura Japonesa aqui em Sampa mesmo e daí pra conhecer outros desenhistas (boa parte já profissionais ) foi um pulo.
    Infelizmente o mercado tem 2 problemas.
    1o: A desvalorização do produto nacional pelos próprios Brasileiros.
    2o: Mudar a cultura deq ilustração/quadrinhos é apenas um nicho e sim uma mídia.

    Ainda existe um certo problema de distribuição, mas creio q esse seja o menor.
    Eu que, infelizmente, ainda ñ trabalho com isso, tenho o desenho apenas como hobby mas vejo sim mudança, ainda q muito pequenas por enquanto.
    Quando os brasileiros aceitarem o Brasil, quando a criatividade brasileira virar modinha, aí sim poderemos dar um passo promissor e aí tentar-mos firmar o mercado.
    E creio q isso ñ tardará a acontecer, ñ por esforço das editoras ou corporações, mas principalmente, por esforço daqueles que acreditam e do próprio público.

    Bjos Raquel, continuarei acompanhando seu trabalho, tanto como desenhista quanto podcaster.
    Fique com Deus

  3. Grandes Filmes Says:

    Raquel,

    Certa vez vi um comentarista literário dizendo que “Vivemos em um país que mal lê e lê mal.” Temos um mercado minúsculo e mal distribuído, cujos olhos estão sempre voltados aos “best-sellers” e às leituras da moda.

    Acaba ocorrendo que a escolha do que será ou não publicado fica à mercê da miopia e da boa vontade de quem está decidindo. Em um mercado tão pequeno, ninguém vai querer arriscar.

    Lamento você não ter ficado em primeiro. Gosto muito de suas tiras e espero, sinceramente, que você não desanime.

  4. raquel Says:

    Ruz, Israel e Zé Luis (Grandes Filmes): Obrigada por suas palavras de apoio e força!
    Estou há mais de 10 anos publicando tiras em quadrinhos e personagens na web. E também neste tempo vi muitos outros cartunistas fazendo o mesmo.
    Quantos destes conseguiram sair do virtual? pouquíssimos!

    Na verdade, em especial para o Grandes Filmes, analisando melhor a escolha do júri, eles não escolheram pelo “quadrinho em si”. O ganhador está dentro do que tem mais rendido no mercado ultimamente: o público nerd.
    Seria realmente uma ilusão pensar que uma editora iria avaliar o trabalho dos cartunistas, quando bem na fuça deles está o pote de ouro para um público e um assunto mais que da moda, que está rendendo bastante.

  5. Rodrigovk Says:

    Olá, Raquel.

    Sou um leitor novo deste blog, por isso não conheço um contexto maior ou seu histórico. Mas sim, eu concordo com você que o espaço para ilustração, tiras e quadrinhos brasileiros é muito escasso. O mesmo se pode dizer da literatura nacional.

    Sobre o concurso, acho que foi um erro dos organizadores misturar um blog sobre quadrinhos com blogs de quadrinhos próprios. Como o concurso foi elaborado por votação popular, é praticamente impossível concorrer com aqueles que têm um enorme volume de acessos.

    Voltando à questão. A internet não só abriu um espaço para autores e quadrinistas colocarem o seu trabalho no ar, mostrar qualidade e publicar um livro. A internet mudou tudo! As próprias editoras “concorrem” com a web se não atualizarem seu modelo de negócio. A impressão que tenho é que não abriu um espaço maior para o pessoal “publicar em papel”, muito pelo contrário, papel é menos rentável que nunca! Por exemplo, o Eduardo Spohr só conseguiu um bom contrato com uma editora depois de vender seu livro como pão quente na Nerdstore.

    Eu entendo o desejo de ver o próprio trabalho no papel, impresso, distribuído, eu mesmo publiquei por conta própria um livro de contos. Mas quando eu digo que a web mudou tudo, significa que você deve encontrar outras formas de ganhar dinheiro com seus quadrinhos, além de publicar em papel. (Mesmo porque a porcentagem do autor nas publicações impressar é mínima).Alguns exemplos que têm dado certo, que seria interessante você voltar os olhos.

    O Carlos Ruas fez um Deus de pelúcia, assim como a Clara Gomes, que fez uma Joana de pelúcia. Aliás, a autora dos bichinhos de jardim já vendia buttons, caixinhas e outras coisas (que ganhei de presente, por sinal). Conheço quem faça quadrinhos de graça na web, mas que volta e meia publica uma hq “premium”, de cerca de 30 páginas, e vende o pdf.

    Nenhum desses exemplos deixou o autor rico. Mas publicar um livro no Brasil também está muito longe disso. Eu sei que a questão não é dinheiro, mas espaço e reconhecimento. Quanto a isso, acho que não posso ajudar mais do que continuar acompanhando o blog e lendo as tiras. E aproveite o espaço que você já tem na web, para inventar outras formas de promover o seu trabalho e ganhar reconhecimento. ;)

    Boa sorte!
    Abraços,
    Rodrigo

  6. raquel Says:

    Rodrigo. Obrigada, e você tem razão. Mudou mesmo!
    Mas eu sou meio cética com relação à lojinha virtual. Quando o Gompy ganhou em 2000 o concurso de sites do Starmedia e Estadão, ganhou nas 3 categorias: Júri, público e melhor site de todos.
    Com todo este sucesso, eu fiz uma lojinha, vendeu, mas não foi lá aquelas coisas. Talvez por ser o ano de 2000 e as redes sociais estavam devagar, não tinha twitter, sei lá…
    Aliás, mudou bastante do ano 2000 para cá. Como você mesmo falou, agora os grandes entraram na internet, para brigar por espaço com os pequenos. E nem sempre a luta é justa.

    O impresso em papel,seja livro ou revista, é um meio de chegar em um publico maior.
    No meu caso: publico infanto-juvenil, que gosta de ir nas Megas livrarias e folhear este tipo de livro. Este público – pela observação que faço nas livrarias e das minhas filhas – gosta mais de ver os quadrinhos no papel do que na internet, diferente do público nerd, que é viciado e fica horas no computador, já vê e baixa tudo por lá.

    Muitos cartunistas conhecidos, como Laerte, Angeli, etc, passaram a produzir livros, pois o mercado para estes era melhor do que as tiras de jornais.

    Se um desenhista quiser sobreviver de desenho autoral está ferrado. Vai ter que camelar muito.
    Vi outro dia um vídeo recente do Carlos Ruas falando que ele “quer viver de quadrinhos e está lutando por isso.”
    A Pryscilla, uma cartunista de Curitiba, famosa, ganhou já vários Salões de Humor, publica na Folha, mas mantém seu trabalho de ilustração para agências.
    Sobreviver (digo sobreviver, e não ganhar um dinheirinho) ganhando pela web, é bem complicado. Claro que há de se tentar, né…

    Mas acredito que se a Pryscilla ou o Benett (outro cartunista do Paraná), não estivessem publicando em jornais e revistas, alcançando um publico maior, não sei se estariam ainda com os seus personagens. Talvez até estivessem, mas não com o mesmo ânimo.

    Abraços,
    Raquel

  7. raquel Says:

    Sobre reconhecimento, tive no passado este reconhecimento: A tira do Nerd saiu em revista lá na Inglaterra entre os Top Webcomics, foi comentada e publicada em sites de quadrinhos americanos. O Gompy também foi premiado.

    A questão é que do reconhecimento para algo mais concreto, são outros 500.

    E é isso que me chateia, pois não depende de talento ou reconhecimento. E sim do que o mercado quer ( e em se tratando de “mercado brasileiro”… estamos ferrados).

    Vejo pelo Ryot. Acho ele fantástico. Ele faz quadrinhos e humor que lembram as tiras que Matt Groening, criador dos Simpsons, fazia nos jornais. Lá ele encontrou espaço para seu humor ácido, insano, e foi chamado para produzir um desenho animado.
    Aqui, tenho certeza que muitos editores vão ver o desenho do Ryot como desenho de palitinhos, underground, não vão conseguir ver “saída comercial”, porque aqui “criatividade” só vem de fora, e quando já fez sucesso mundial.

    Bom… depois do meu desabafo contra o mercado editorial brasileiro, voltemos a programação normal.

  8. Felipe Says:

    Ei, não desanime com o resultado do blog books!
    Concordo que foi decepcionante, mas tenho certeza que dias melhores virão.
    Quando começou o concurso, o único concorrente que eu conhecia era o Ryot. Hoje posso dizer que conheço mais, vi as qualidades de cada um, e passei mais tempo lendo as suas tirinhas que navegando no site “vencedor”.
    Então, mesmo que seja só pela publicidade do concurso, você já é uma vencedora.
    Parabéns!
    =)

  9. raquel Says:

    Obrigada Felipe!!! =)

  10. Ju Teófilo Says:

    Mafalda
    SIm, eu vi e não acreditei. NAda a ver com a categoria, que devrei ser então cultura pop e não quadrinhos.
    Entendo seu desânimo.
    Vivemos num país colonizado e pobre em vário sentidos. Não criamos leitores. Não temos consumidores de coisas feitas aqui…Só pra axé e sertanejo…reality shows e afins…
    A associação de produtos talvez seja uma forma. Mas tem que haver um levantamento do seu público, muito preciso, pra nao ter prejuizos.
    Por exemplo, nada a ver com o assunto,mas aproveitando: tava vendo seu background do twitter e vi as várias monalisas que vc fez (acho que foi vc). Aquilo dava uma montagem e uma camiseta mega legal pra vender no site e servir de divulgação (com nome do blog ou do podcast).
    Uma tiragem pequena e limitada e promoções dando algumas camisetas podem parecer coisas bobas mas que são legais para os fãs fieis e que divulgam o trabalho.
    Enfim, sempre penso no seguinte: criar é algo intimo e pessoal. Talvez HOJE vc nao tenha o reconhecimento que mereça, pois há um mercado hoje que não absorve algumas coisas. Mas o que nos reserva no futuro? QUantos grandes artistas só foram reconhecidos muito depois? Sim, eu sei que é foda, mas não gostaria que abandonasse a turma da Pluma. É uma graça, coisa fofa.E ainda terá seu merecido espaço!
    OUtra coisa que percebo, é que pra desenhistas/cartunistas conseguirem algum espaço formar grupos pode ser algo vantajoso. Grupos com objetivos comuns, agregando forças e meios de exposição. As pessoas precisam ser expostas ao trabalho do artista muitas vezes para começar a compreender, gostar, divulgar, consumir. Tiro isso pensando em mim como consumidora tb.
    No Jornal que eu faço tiras semanais há um grupo de cartunistas que se reunia pra criar exposições etc. Como eu sou de outra cidade nao era tao ativa, mas sempre aderi e dei força. sE a gente pensar na historia do Glauco, Angeli, Laerte etc verá que fizeram de certa formaram grupo pra somar esforços e criar algo com maior poder de exposição na midia da epoca etc.
    Na dec de 80 consumiamos revistas que eram publicacoes independentes desses grupos. Planeta Diario, Chiclete etc. Nao sei do ganho desse povo, mas a exposição era boa.
    Bem, minhas impressoes sao achismos de uma leiga. Vc esta no mercado e deve saber. Mas acredite no seu trabalho e continue. Talvez a geração que ira descobri-lo ainda esteja crescendo, quem sabe? O que esperar de um pais que vai eleger o Tiririca ?!
    Mas eu fiquei fã e vou divulgar seu trabalho e torcer pelo seu sucesso sempre! Dar o premio para algo fora da proposta pra mim mostrou que o premio é meio fail. Escolhem pensando só no mercado mais amplo e ponto ( e me questiono sobre esse mercado tb).
    Que a força esteja com vc!!
    Bjs da fã indignada

  11. raquel Says:

    Ju, obrigada!!!!
    Aquelas monalisas não foram obra minha, não. Mas realmente dá uma ótima camiseta.
    Sobre artistas reconhecidos bem depois, nem vamos lembrar daqueles que só foram reconhecidos depois que morreram, né? :D
    De fato, um grupo chama mais a atenção e tem mais força. Na época do Angeli, Laerte e cia, o pessoal consumia mesmo o Chiclete com Banana! Era outra época, e hoje em dia não teria tanta força.
    Mas é tudo questão de se ajeitar com a época, não é mesmo?
    Valeu o comentário e a divulgação. Fico muito agradecida, Ju!
    Beijos,
    Raquel

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